Investigação aponta como Empabra forjava recuperação ambiental para minerar na Serra do Curral


Relatório da Polícia Federal (PF) aponta que houve extração ilegal em área tombada do ponto turístico de Belo Horizonte por 11 anos. PF pede à Justiça busca e apreensão e bloqueio de bens de ex-gestores ligados à mineradora. Atividades da Mineração Pau Branco (Empabra) na Serra do Curral em 2024
Lucas Franco/TV Globo
A Polícia Federal detalhou, em inquérito, como a mineradora Empabra forjou a realização de ações de recuperação ambiental de área tombada da Serra do Curral, em Belo Horizonte, para extrair minério de forma ilegal entre os anos de 2014 e 2025.
De acordo com a PF, os responsáveis utilizaram o Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD), aprovado em 2008, como fachada para ampliar a exploração mineral na área da Mina Granja Corumi.
Como consequência, ainda segundo a investigação, a exploração provocou a destruição de nascentes e cursos d’água, como o Córrego Taquaril, além de possível contaminação do lençol freático. (saiba mais abaixo)
Antes e depois de pontos da Serra do Curral, destacados pelo inquérito.
Reprodução
O esquema
Em teoria, o PRAD autorizava a retirada de quatro milhões de toneladas de resíduos de minério historicamente acumulados no local, com prazo de execução de até três anos, sob o pretexto de recuperação ambiental.
Na prática, laudos periciais e auditorias da Controladoria-Geral da União (CGU) e da própria PF apontam que, a partir de 2014, os responsáveis implantaram cavas de mineração de grande porte e continuaram as atividades mesmo após o fim da retirada dos resíduos previstos.
A investigação integra a Operação Parcours, que, no final de março, revelou o esquema envolvendo servidores da Agência Nacional de Mineração (ANM), geólogos e a mineradora Empabra para viabilizar essa exploração na Mina Granja Corumi, e resultou na exoneração de um gerente da ANM.
A PF solicitou à Justiça mandados de busca e apreensão de documentos, bloqueio de bens de ex-gestores ligados à mineradora e realização de diligências complementares para apurar outras possíveis participações de servidores públicos no esquema.
O g1 entrou em contato com a mineradora Empabra, com a ANM e com os investigados, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Documentos fraudados
A apuração aponta ainda que, entre 2014 e 2019, foram criadas duas grandes cavas na área da mina — chamadas de “Sump 3” e “Sump 4”.
Em documentos oficiais, a empresa informou que se tratavam de reservatórios de contenção de água para recuperação ambiental, quando, na verdade, eram escavações com objetivo de extrair minério in situ — ou seja, minerais ainda presentes no solo.
Servidores públicos também são alvo da apuração por possível omissão ou favorecimento no andamento de processos administrativos vinculados à ANM.
Ainda segundo a investigação, as escavações foram feitas em locais não autorizados, em desacordo com os limites legais da concessão e em áreas vizinhas pertencentes à União.
Antes e depois de pontos da Serra do Curral, destacados pelo inquérito.
Reprodução
Impactos ambientais
Imagens de satélite e documentos obtidos durante a apuração revelam que a exploração provocou a destruição de nascentes e cursos d’água, como o Córrego Taquaril, que secou em 2017, além de possível contaminação do lençol freático.
Os peritos também identificaram que, após a interrupção das atividades em 2019, a área da principal cava passou a permanecer alagada, mesmo em longos períodos de estiagem.
A hipótese levantada é que a escavação tenha atingido o lençol freático, gerando impactos sobre a disponibilidade e a qualidade da água subterrânea na região.
Linha do tempo
1958 a 1990 — Mina Granja Corumi é explorada legalmente pela Empabra para extração de minério de ferro;
1990 — A Serra do Curral é tombada como patrimônio ambiental, histórico e paisagístico por legislação municipal e estadual. A exploração é suspensa.
1994 a 2006 — A mina fica paralisada por força de restrições ambientais. A Empabra é pressionada a reparar os danos ambientais. O Ministério Público move ações civis públicas.
2008 — É aprovado o PRAD (Plano de Recuperação de Área Degradada), com autorização para retirada de até 4 milhões de toneladas de material, reconfiguração do terreno e recuperação ambiental em até 36 meses.
2014 — Retorno da exploração mineral, com criação das cavas profundas, sob o pretexto de recuperação ambiental.
2015 a 2017 — Seca do Córrego Taquaril, destruição de nascentes e relatos de contaminação e falta d’água em empreendimentos da região, como o Minas Country Clube.
2018 a 2019 — Interrupção da exploração nessas cavas profundas, por exaustão de minério ou problemas geotécnicos com o lençol freático. A área passa a ficar alagada mesmo em longos períodos de seca.
2019 — Formalizada a venda da mina por André Maurício aos empresários Kallas, Franceschini e Bruno Luciano. Eles assumem a responsabilidade por danos futuros.
2020 a 2024 — A PF e a CGU intensificam a apuração, com perícias e imagens de satélite que mostram a expansão ilegal e deliberada das cavas, confirmação do uso do PRAD como fachada para lucro com extração de minério e identificação que uma cava atingiu o lençol freático.
2024 — PF realiza monitoramento da área e vigilância fotográfica, comprovando alagamento e bombeamento irregular de água.
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