Doméstica é resgatada após 22 anos sem salário vivendo em condição análoga à escravidão em Manaus: ‘trabalhava por comida’


Vítima foi aliciada aos 12 anos sob promessa de estudar e passou mais de duas décadas trabalhando sem salário fixo, em condições degradantes. Doméstica que vivia em situação de trabalho escravo é resgatada após 22 anos em Manaus
Uma trabalhadora doméstica de 34 anos foi resgatada de uma situação de trabalho escravo no bairro Ponta Negra, Zona Oeste de Manaus, na quinta-feira (6). A vítima vivia nessas condições desde os 12 anos de idade — ou seja, por mais de duas décadas — sob a justificativa de que “fazia parte da família” que a explorava.
O resgate foi realizado durante uma ação conjunta do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), do Ministério Público do Trabalho (MPT), da Polícia Federal (PF) e da Defensoria Pública da União (DPU).
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Segundo as autoridades, a mulher foi levada ainda criança para a casa da família com a promessa de que teria oportunidades de estudo e uma vida digna. No entanto, a realidade foi diferente: ela passou mais de duas décadas trabalhando sem salário fixo e em condições degradantes.
“Essa trabalhadora foi aliciada aos 12 anos de idade sobre a falsa promessa de ser bem tratada e frequentar a escola. Ela foi, na verdade, posta a trabalhar cuidando de uma idosa, além de inúmeras outras atividades ao longo de 22 anos de exploração”, afirmou o procurador Luciano Aragão, coordenador Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo.
Durante todo esse tempo, a mulher prestou serviços a diversos membros da família em troca de comida, moradia e pagamentos esporádicos com valores considerados irrisórios.
“Trabalhava em troca de alimentação e moradia. Quando recebia, eram valores irrisórios. Não tinha uma remuneração pelo trabalho que prestava”, completou Aragão.
A vítima vivia sob as seguintes condições:
Quarto sem guarda-roupas, ar-condicionado ou higiene mínima
Trabalhos exaustivos e sem qualquer remuneração fixa
Sem carteira assinada nem acesso à escola
Andava descalça e, em certo período, não tinha nem shampoo
Fazia serviços domésticos e também atuava na produção de doces vendidos pelo empregador
Fim do ciclo abusivo
Vítima de trabalho escravo doméstico resgatada em Manaus
Divulgação
Mesmo após a morte da idosa que seria inicialmente cuidada, ela permaneceu sob exploração. A equipe de fiscalização confirmou os relatos em depoimentos.
O ciclo de abusos chegou ao fim com o resgate. A vítima recebeu atendimento psicossocial da Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc) e foi reintegrada à sua família biológica. Além disso, será indenizada pelos danos sofridos ao longo dos anos.
“O papel do Ministério Público do Trabalho nessa situação é exigir o pagamento de todos os direitos que foram sonegados ao longo desse período contratual e também pedir uma reparação individual por toda a lesão que essa trabalhadora sofreu por conta dessa exploração”, destacou a vice-coordenadora Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo, Tatiana Simonetti.
“É de extrema importância que situações como essas sejam denunciadas para que as autoridades possam adotar as medidas cabíveis e a gente possa, de fato, garantir proteção e direito a todos os trabalhadores que estão na situação de exploração”, concluiu.
Os empregadores firmaram termo de ajuste de conduta no Ministério Público do Trabalho para pagar indenização à trabalhadora. Também será lavrado auto de infração pelo Ministério do Trabalho. Além disso, o relatório da força-tarefa será encaminhado à Polícia Federal para as providências cabíveis.
Como denunciar trabalho escravo?
Desde 1995, quando foi criado o sistema de combate à escravidão no Brasil, mais de 65 mil trabalhadores foram resgatados. Os dados estão disponíveis no Radar do Trabalho Escravo.
Denúncias de trabalho escravo podem ser feitas, de forma anônima e sigilosa, pelo:
Sistema Ipê (https://ipe.sit.trabalho.gov.br)
Disque-denúncia 127
Ouvidoria do Ministério Público do Trabalho no Amazonas e Roraima (MPT AM/RR) (https://www.prt11.mpt.mp.br/servicos/ouvidoria)
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